segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Do ministério à presidência – duas histórias






Um era ministro da Fazenda do governo de Itamar Franco. Outra, hoje, é ministra da Casa Civil do governo Lula. O primeiro, quando assumiu o mais difícil dos ministérios, em 1993, tinha um grande desafio pela frente: acabar com a inflação. Três outros ministros já haviam sido demitidos por Itamar por não apresentarem resultados contra o grande mal que afligia os brasileiros.

A segunda assumiu em 2006 a mais importante pasta do atual governo, a Casa-Civil, substituindo o companheiro José Dirceu, denunciado por corrupção. Os desafios eram reorganizar um ministério desestabilizado pela saída de seu chefe e tornar-se o principal nome à sucessão do presidente Lula.

O primeiro, fundador do PSDB e ex-senador, Fernando Henrique Cardoso, aos poucos, se consolidou como o mais eminente homem para substituir Itamar Franco. Com um projeto econômico simples, montado com diversos amigos economistas, o sociólogo conseguiu diminuir uma inflação acumulada no ano de mais de 2700% para apenas 15%. O notável é que essa queda aconteceu em plenas eleições de 1994, e garantiu a vitória de FHC sobre Lula, hoje chefe da segunda, Dilma Rousseff.

Assim como Itamar Franco, que lançou seu mais importante ministro às eleições de 1994, Lula deseja nomear Dilma, considerada o segundo nome do governo do PT, candidata à presidência da República pelo partido em 2010.

Outra importante semelhança entre Dilma e FHC é sua posição nas pesquisas. Fernando Henrique teve de enfrentar as pesquisas que apontavam, em 1994, uma vitória esmagadora de Lula nas eleições. A ministra de Lula, hoje, aparece bem atrás do também ex-ministro, José Serra.

Similaridades a parte, o que se pode contabilizar são as contribuições dos dois ministros à atual situação política e econômica do Brasil. Fernando Henrique usou como mote de campanha sua contribuição para tirar milhões de brasileiros da pobreza ao fazer cair a inflação, ainda como ministro.

Dilma Rousseff, diferente de Palocci, não contribuiu para os avanços econômicos do governo Lula. Como plataforma de campanha, a ministra usa de importantes programas sociais, como o PAC – Programa de Aceleração do Crescimento, que é alvo de inúmeros bloqueios por parte do Tribunal de Contas, e o recém-criado Minha Casa, Minha Vida.

Todavia, diferentemente de Fernando Henrique, que tinha apenas uma obra para apresentar aos eleitores, Dilma, além dos programas sociais que ainda engatinham, tem a ligação com o que talvez seja o mais popular dos presidentes brasileiros. Necessita, para isso, que a imagem do presidente Lula seja transmitida a ela.

Apesar das semelhanças entre Fernando Henrique Cardoso e Dilma Rousseff, esta herdou de seu chefe o discurso de oposição a qualquer preço. A ministra do PT não para de explanar toda sua admirável capacidade administrativa em detrimento da incapacidade dos homens de seu governo e do anterior de fazer a “máquina andar”. Dilma afirma que, antes de Lula, existiam as trevas, e que ele a ensinou o caminho para o progresso.

Do ministério à presidência, como se vê, é um caminho fácil. Basta que se trabalhe com seriedade. O possível candidato tucano, José Serra, também fez muito enquanto ministro de Fernando Henrique.
Que se contabilize, portanto, o quanto os dois possíveis candidatos – e o próprio FHC - trabalharam até hoje. Fugindo à estratégia enganosa de se comparar o presente ao passado.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

O cinema brasileiro, de Surfistinha a Lula












O ano de 2010 será inesquecível para a história do cinema nacional. Pela primeira vez, o brasileiro poderá ver na telona duas histórias peculiares à história do Brasil. Logo no começo do ano, no dia 1 de janeiro, estreia nos cinemas de todo o país Lula, o filho do Brasil. Alguns meses depois, é a vez de O doce veneno do escorpião, filme baseado no livro homônimo de Bruna Surfistinha.

As semelhanças entre Lula, o filho do Brasil e O doce veneno do escorpião são poucas, apesar de muitas. Sim, isso é contraditório, mas explico. Ambos os filmes retratam a vida de dois personagens excêntricos do país. Um conta a história de uma jovem de classe média que decide ser prostituta. Outro relata um pouco da vida de um retirante nordestino, pobre, que decide ser político. Espero que vocês entendam que a similaridade aqui fica por conta do gênero biográfico. Mas há outras analogias.

O filme que relata a vida da jovem paulista recebeu, para sua produção, mais de R$ 3 milhões de reais em renúncia fiscal. Isto é, a verba para a execução do longa foi aprovada pelo Ministério da Cultura e origina-se do pagamento de impostos. No entanto, comparado com o custo do filme biográfico de nosso atual presidente, “O doce veneno do escorpião” não saiu tão caro assim. Lula, o filho do Brasil gastou até aqui R$ 12 milhões de reais, ou seja, quatro vezes mais que o filme da Surfistinha. E a semelhança?, você se pergunta.

Uma das muitas polêmicas que envolvem o filme de Lula é a origem da verba para sua produção. De acordo com a Agência Estado, o longa recebeu verba de algumas empreiteiras, dentre outras grandes empresas ligadas ao Governo Federal. O notável é que essas empresas obtiveram ou estão para obter financiamentos de órgãos federais.

A diferença dentro da semelhança, portanto, é que o filme que retrata a história da hoje ex-prostituta recebeu verbas federais formalmente, dentro da lei. Enquanto Lula, o filho do Brasil, obteve dinheiro de modo bem conhecido por nós, brasileiros: através do famoso jeitinho brasileiro de burlar a lei, ignorando a existência da moral.

Em suma, debruçamo-nos até aqui numa analogia entre os dois filmes, seja por seu caráter biográfico: ambos se basearem em filmes sobre as duas personalidades – sim, o longa sobre Lula é baseado também em livro homônimo, de Denise Paraná. Seja também pela semelhança no ano de estreia e na origem infeliz da verba para suas produções.

Aguardemos, agora, para descobrir qual história comoverá mais aos brasileiros que, direta ou indiretamente, estão pagando pelas duas obras. Qual vida entreterá mais o público, a do nordestino pobre que se tornou político ou a da menina de classe média que virou prostituta? Esperemos para ver se as semelhanças param por aqui.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

O que é Lua Nova?




Creio que poucas obras refletem tão bem a atualidade como os filmes Crepúsculo e Lua Nova. Do primeiro, não tenho porque me queixar, pois não o assisti. Infelizmente, o mesmo não me aconteceu com o segundo. Fui induzido a cometer o tão insidioso ato de assisti-lo em nome da boa relação humana. Lua Nova agora vai ser o meu pesadelo de 2009. Quando lembrar-me desse ano algum dia no futuro, lembrarei do quanto o mundo já estava corroído por obras superficiais e baratas como o referido filme.

O grande problema, devo salientar, não é especificamente com Crepúsculo, Lua Nova e os outros filmes da série que ainda serão feitos. Obras como essas existem várias por aí, algumas até mesmo com atores, direção, fotografia e roteiro piores. Sei que parece impossível, mas existem sim, basta assistir aos filmes exibidos na TV Globo. O assombroso nessa série de filmes pueris baseados em livros de uma tal Stephanie Meyer é o grau de arrebatamento que ela suscita na sociedade.

Há meses não se fala em outra coisa em universidades, bares, lares e estaleiros. Fala-se de um “casal perfeito”, da beleza dos protagonistas e outras coisas fundamentais às pessoas de pouco juízo. Mas o que é, afinal, Lua Nova?

Quando pensei que tivéssemos deixado para trás esse cultivo infantil a lendas de vampiros e lobisomens, eis que essas antigas histórias ressurgem para ilustrar o amor de Bella e Edward. E, como se não bastasse, insinuando o amor impossível de uma humana por um vampiro, remetendo conscientemente à história de Romeu e Julieta – o livro de Shakespeare aparece no filme para ilustrar essa semelhança.

Lua Nova é, sem dúvida, um filme que retrata bem nosso tempo: a superficialidade e a fantasia redimindo-nos da dura realidade cotidiana. Pão e circo – nunca usei essa expressão, mas aqui ela é válida. Pensando assim, o filme tem lá seu valor.

Para os apaixonados por cinema, no entanto, fica a sensação de fim do mundo. Ninguém sabe ao certo nem a qual gênero pertence Lua Nova. Afinal, é romance sem ser romântico, é suspense sem ser um Hitchcock, é drama sem comover ninguém. Mas atrai o público como dinheiro.