quarta-feira, 17 de novembro de 2010

O que não foi feito

As eleições 2010 marcaram a segunda escolha de um presidente desde minha chegada à idade adulta. Em meus 19 anos, quando Lula foi reeleito, meu discurso pairava mais sobre os escândalos de corrupção, inerentes a esse governo. Contudo, nestas eleições não apenas a ilicitude chamou minha atenção. Também atentei ao modo de governo que pregavam e aos discursos dos presidenciáveis no decorrer da campanha. Em meio a isso, uma coisa vi como certa: vencendo qualquer um dos dois primeiros colocados, continuaríamos onde estamos. E onde estamos, apesar da propaganda do atual governo, não é nada auspicioso.

Dois presidentes da república se destacaram e foram responsáveis pelo que de bom ocorreu ao Brasil após o fim da ditadura. Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, nomes importantes na luta pela democratização, tornaram-se presidentes. Um modernizou o país, fez com que o capitalismo – sempre atrasado na América Latina – garantisse nosso progresso. Outro distribuiu renda. Fizeram história, sabemos todos. No entanto, nenhum teve a coragem de concretizar as tão sonhadas reformas política, tributária e previdenciária, sem as quais continuaremos com os mesmos entraves políticos e econômicos.

Passados 16 anos, nosso sistema político ainda é o que podemos chamar, grosseiramente, de um horror. Votamos num deputado e elegemos outros. Inúmeras regiões no país não conseguem eleger um representante para as assembléias legislativas ou para a Câmara Federal. Milhões ficam sem representação no legislativo. São Paulo, estado com maior número de eleitores, não tem a quantidade de deputados federais que lhe cabe.

O mar de corrupção nos governos, diferentemente do que pensam alguns, poderia muito bem ser contornado com a diminuição dos cargos comissionados, uma das importantes propostas da reforma política. São esses cargos, entregues a partidos aliados no intuito de se obter maioria no legislativo, os responsáveis pela esmagadora maioria dos escândalos políticos. A redução no número de funcionários nomeados seria a melhor medida contra isso. Algo que, no governo Lula, agravou-se com o avultante aumento no número de servidores dessa espécie nomeados.

Mesmo com sua alta popularidade – pesquisas apontam 80% de aprovação ao seu governo – Lula não conseguiu fazer andar no Congresso medidas contra problemas políticos comuns ao Brasil. Assim como FHC, o presidente petista não trouxe à tona questões importantes, como financiamento público de campanha, voto distrital, fim do foro privilegiado, entre outros temas. Perdeu-se uma oportunidade que, acredito, não reaparecerá no governo de sua sucessora, Dilma Rousseff.

A única grande iniciativa política efetivada nos oito anos do governo petista veio de um anseio popular, a Ficha Limpa. A medida, hoje em vigor, impede (e já impediu) que políticos com processos em segunda instância se candidatem – ou sejam eleitos - a cargos públicos.

Se em reforma política pouco ou nada foi feito pelo governo Lula, em economia também nada mudou. Contamos ainda com as medidas econômicas implantadas por Fernando Henrique. Temos ainda a maior taxa de juros do mundo. Os impostos pesam do mesmo modo sobre ricos e pobres. Produtos básicos de consumo, como alimentos, têm alta carga tributária. Enfim, nenhuma reforma cuidou de modificar uma estrutura tributária arcaica, que sufoca milhões de brasileiros.

Com o fim dos oito anos de seu governo, Luís Inácio Lula da Silva deixará o cargo com a mais alta popularidade que um presidente já teve no Brasil. Seu legado consistirá nos milhões de brasileiros que saíram da miséria ou assomaram à classe média. A velha esperança de uma esquerda ainda não extasiada de que se mudassem as estruturas do país com a chegada de um sindicalista ao poder não se consumou. Tampouco os que desejavam medidas eficazes contra problemas peculiares a esta terra foram atendidos. Mas estes não esperavam mais do atual presidente. Não se deixaram levar pelo endeusamento lulista dos últimos anos.

Assim, quando deixar o governo, Lula terá desperdiçado a maior chance que um presidente teve para remodelar o Brasil. No lugar de políticas sociais efêmeras, reformas que proporcionasse a todos direitos fundamentais. E isso, somente com as reformas citadas acima. Algo que, a julgar pela fragilidade da candidata vencedora, não ocorrerá nos próximos quatro anos.