quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

O espetáculo da imprensa e a corrupção do cotidiano



O dia-a-dia de nossa imprensa parece demarcado pelo apocalipse da corrupção política. Talvez nunca tenham sido veiculadas tantas denúncias de corrupção como nos últimos cinco anos. As notícias de falcatruas de nossa classe política viraram o grande elemento de constituição de jornais e revistas. Por trás dessa pandemia tresloucada, interesses de todas as espécies: poder, dinheiro, ideologia, etc. Ou, quem sabe, o tom dado pelos jornalistas acerca da corrupção política seja apenas uma forma de retaliação ante a impunidade e o silêncio dos cidadãos. Mas, de qualquer modo, tais excentricidades perpetradas por nossa mídia podem acarretar em uma visão negativista e também apocalíptica da população em relação à política.

Não podemos medir as influências da imprensa no cotidiano dos cidadãos. No entanto, conceber que o negativismo imposto por nossos jornais e revistas influencia pesarosamente nas ações das pessoas não é nenhum desvario. Como bem afirma Contardo Calligaris (A armadilha da corrupção, 03/11/2005, Folha de SP), a imprensa, mesmo fazendo o que deve fazer, que é publicar o que ela descobre, acaba por incutir em seus leitores o lugar-comum de que todos são corruptos. Isso os inibe, segundo o psicanalista, em sua capacidade de agir.

Todavia, além do crescente espetáculo em cima da corrupção impetrado pela imprensa fazer com que os cidadãos criem certa repulsa pela política, ele é capaz de influenciar as pessoas a construírem determinadas formas de retaliação. O famoso jeitinho brasileiro, bem sabemos, é capaz ser esticado ao ponto de extrapolar com a moral. Assim, as inúmeras e corriqueiras ações dos cidadãos em seu dia-a-dia, sejam através de sonegação de impostos, de compra de produtos pirateados, de oferecimento de propina a funcionários públicos podem ser uma forma de contrapartida às ações ilícitas de nossos políticos.

Segundo antropólogos, o “jeitinho brasileiro” é uma espécie de refúgio ou saída que a população encontrou para sobreviver no Brasil. Isso oriunda dos tempos em que o país era colônia de Portugal, quando nossos índios tinham que ser hábeis no trato com os portugueses a fim de garantirem sua sobrevivência. E, hoje, é uma forma de se sustentar ante políticos e empresários.

Resta saber quem são os verdadeiros culpados, ou melhor – como, juridicamente, todos o são – quem são os precursores do sentimento de corrupção generalizada. Isto é, em um país como o Brasil, onde os políticos, os empresários e os cidadãos cometem atos ilícitos, quais são os responsáveis pela corrupção, ou, quem influencia mais essa pandemia cíclica e corrosiva.

3 comentários:

Sandro Dantas disse...

Voto por um orgão regulador de imprensa mais rigoroso. A tão aclamada liberdade de imprensa chegou a um ponto limite. As emissoras já não têm preocupação em transmitir o mínimo de educação e cultura. Então por que não exigir alguns requisitos já que a frágil população é tão influenciada pelos televisores?

Anderson Oliveira disse...

O que é difícil determinar, Alessandro, é até onde deve ir a liberdade de imprensa e a censura da mesma. Ou seja, como fazer com que ela tenha qualidade, sem inibir a liberdade de criação.

Algumas coisas parecem ser fáceis, mas tem em si um mar de complexidades. Encontrar os limites de coisas não palpáveis é um desafio praticamente impossível ao homem.

Agora questiono, o que é o mínimo de educação e cultura? talvez o que você e eu entendemos como algo que enalteça o homem, porém, todos pensam do mesmo modo? Não!

É difícil.

Alessandro D. disse...

Trata-se de uma questão filosófica.O paradigma de liberdade é demasiadamente abstrato. Liberdade descontrolada torna-se anarquia.

Propor-lhes-ia mínimos, não limites. Mínimos de educação - ciências, meio ambiente, tecnologia, cidadania etc - e de cultura - história, geografia, ates.

Realmente, se isto fosse simples já estaria implantado. Mas precisamos apenas de um pouco mais de diligência para retirar de nossos televisores um pouco desta dramaturgia inprofícua e deste jornalismo sensacionalista. É a preguiça que nos destrói!