Alguns dos que hoje se inflamam em virtude de uma das mais conturbadas eleições de nossa jovem democracia, décadas atrás faziam coro contra uma ditadura que perseguia e os punha à margem de qualquer liberdade. Jornalistas, políticos e intelectuais lutavam em conjunto, cada um à sua maneira, em busca do sistema político que relutava em firmar-se neste solo. Uma almejada democracia, que cuidaria de proporcionar-lhes direitos inabaláveis como o de se expressar e agir politicamente.
Este grupo, composto pelas mais distintas ideologias, imbuídos por diversos interesses, combatia o Regime Militar munidos de armas e palavras. Alguns viam no partido de oposição, o MDB, uma ferramenta de diálogo em busca da efetivação do sistema democrático. Outros agiam nas ruas, com grandes movimentações populares a fim de chamar a atenção do mundo. Também havia os que pegavam em armas, atacavam instituições do governo militar, embasados nos ideais marxistas de que somente através da luta, da derrubada violenta do sistema vigente, se poderia chegar ao que, segundo eles, seria o mais justo e humano modo de viver: o comunismo.
Juntos, liberais e socialistas, políticos progressistas e conservadores despojados do poder conseguiam coexistir amparados num ideal maior: a conquista da liberdade. Com um inimigo comum, era na junção dessas milhares de vozes que a luta ganhava força. Via-se uma solidariedade jamais alcançada nesta terra tão desacostumada com o bom-senso.
Não obstante, hoje libertos daquele inimigo comum - o regime que levou algumas centenas de personagens de nossa história, amigos e familiares destes homens de hoje -, aquela doce solidariedade transformou-se em militância acéfala. Os mesmos políticos e intelectuais que, unidos, lutavam por direitos que ora usufruímos como senso-comum, transformaram-se em inimigos declarados, incitando suas massas de seguidores a uma batalha cotidiana de golpes baixos, ataques chulos e irrefletidos.
A internet, que muitos viam e ainda veem como sendo um espaço de diálogo e convergência, tornou-se terreno frutífero para a disseminação de asneiras, de discursos vazios inerentes a leitores de pouca leitura. Onde se esperava diálogo, encontra-se uma retórica virulenta, impregnada de termos de baixo calão.
Em meio a isso, parece que a sorte está ao lado de quem não tem acesso ao ciberespaço e consegue viver muito bem desprovido de informações que parecem nada ter a acrescentar a nossa história política. Evita-se, assim, o estresse proporcionado pelo rancor e a ignorância de militantes alienados a uma coisa que mal conhecem e, talvez, nem exista.
Parece que o vazio de nossos dias, em que nada mais há a se construir, faz com que se criem causas difusas, se façam inferências insanas e esquizofrênicas a despeito de nossa atual situação política. Criam-se demônios onde, décadas atrás, viam-se super-heróis.
2 comentários:
Meu caro, a democracia é esta liberdade, sem punhos de renda. Aqui e ali, há excessos. Sem problema; antes "mil flores" florescendo, um pouco anarquicamente, do que o silêncio e o "bom comportamento" das ditaduras. Não é o vazio, é a plenitude democrática, dando vazão a projetos, propostas de sociedade e, também, a paixões desmedidas. Que bom.
Realmente...o poder está nas mãos de quem detém as informações, mesmo que a imparcialidade pareça muito mais atraente e, de certa forma, confortável...
Verdade imutável: Quem detém as informações manipula quem não as detém...
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