A mulher refletia há alguns minutos. Parada ela olhava para cima, logo depois descia, avaliava seu sapato novo, seu jeans que acabara de sair da loja. Sua vida havia mudado. Era nisso que pensava. Sem dúvida essas eleições foram as que deram os melhores frutos a ela. Lembrava da cesta básica, da TV - que não era 29 polegadas, mas podia transmitir a novela – havia também a bicicleta de seu filho, o emprego de sua filha. Junto a isso o liquidificador, as prestações atrasadas da geladeira nova, as contas pagas. Ela sorriu ao lembrar das onze coisas que conseguira arrancar de onze, dos doze candidatos a vereador de sua cidade.
Dona Maria, como era conhecida em seu bairro, era uma mulher honesta, trabalhava de doméstica para poder sustentar seus nove filhos. Filhos que colaboraram muito na conquista de todos esses presentes acima. A mulher estava feliz com tudo isso, mas algo a incomodava muito: o décimo segundo candidato, esse não a subornou. Bem que ela havia tentado, foi em sua casa, expôs os 11 votos que ele conseguiria se desse a ela um fogão novo, mas nada. Sem desistir diminuiu a exigência, o gás do mês, isso ele não poderia negar, porém o homem recusou novamente. Irritada, a mulher se pôs a xingar, armou um barraco, sentiu-se ofendida, não adiantou. Ela pensava nisso, ali, de frente para aquela máquina com teclas de 0 a 9, com um “confirma”, um “corrige” e um “branco”.
Mudando o apoio de uma perna para outra, a mulher, voltou ao passado, bem antes de ter se vendido a políticos inescrupulosos e normais. Ela lembrou de sua vida sofrida, da fome de seus filhos, do quanto seu marido trabalha para colocar menos de um salário mínimo dentro de casa. Ela viu a cena, uma lágrima invadiu seu rosto seco e coberto de rugas de idade e de sofrimento. Não queria só aqueles presentes momentâneos, queria uma vida e isso aqueles onze ordinários não prometeram a ela. Era o momento de se decidir, a fila para a votação já estava grande, todos chiavam.
No caminho para casa veio cheia de si, estava orgulhosa de ser como é. A mulher ansiava pelo resultado, tinha quase certeza que seu 12° homem iria vencer. Ele sim, pensava ela, não tentou me comprar com presentes fugazes, esse é honesto. E dona Maria viveu feliz. Naquelas eleições acertou, o 12°, o que não a subornou, venceu. Uma pena que isso não tenha sido um sinal de moralidade, o fato foi que durante 4 anos o homem nada fez, apenas uns desviozinhos aqui, um suborninho ali. Mas dona Maria nem viu.
Textos sobre política, cultura, economia e esportes. No geral, assuntos oriundos dos cadernos de jornais. No entanto, reservamo-nos o direito de viajar a outros mundos.
sábado, 30 de agosto de 2008
Um voto mais honesto
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